O Fetiche da Democracia

A democracia não é uma virtude em si, mas um meio para um fim maior.

O economista e filósofo austríaco Friedrich Hayek (1899 -1992), em sua magistral obra “O Caminho para a Servidão”, alerta que, se convocada para um hipotético plebiscito, a maioria da população de um Estado, desde que persuadida pela propaganda do governo, poderia, democraticamente, optar por uma economia planificada nos moldes da União Soviética. As dificuldades dar-se-iam, todavia, em como colocar em prática essa planificação.

O parlamento teria de deliberar sobre os pormenores da interferência estatal nos diversos aspectos da vida privada do indivíduo. Verificado, então, que o consenso parlamentar beira à utopia, sobretudo pela impossibilidade fática dos representantes em conhecer de todas as querências de seus representados, delegar-se-ia tal tarefa às mãos de especialistas.

Estes especialistas executariam as medidas de acordo com a sua visão de economia, de mundo; enfim, executariam as medidas de acordo com a sua visão de natureza humana. Estaria, assim, aberta a estrada para o autoritarismo. (Nota: o leitor lembra dos “conselhos populares” que a ex-presidentÁ queria criar em meados de 2014? Pois então, qualquer semelhança com os “especialistas” aludidos acima NÃO é mera coincidência).

Hayek chama atenção para o fato de uma das virtudes – senão a principal virtude -, do individualismo liberal clássico ser, precisamente, a delegação ao Estado da competência para gerenciar um leque reduzidíssimo de questões, principalmente aquelas em que a população alcança um elevado grau de consenso, como a defesa externa, a administração da justiça, a segurança pública, a saúde e...chega!

O austríaco, além da brilhante carreira lhe ter granjeado um prêmio nobel em economia (1974), escreve muito bem. É daqueles livros que, como um bom vinho, deve ser delibado devagar, com uma solene pausa para reflexão ao final de cada capítulo. Bem diferente do vulgo, que despeja ideias e clichês nas páginas, Hayek é sutil. Ensina que a busca da democracia só se legitima quando visa a limitação do poder central e o prestígio da liberdade individual. Não são poucos os exemplos em que a “voz do povo”, ou a mais recente “voz das ruas”, afiança ditaduras mundo afora. E não há ditadura mais perversa daquela travestida de democracia.


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