A Turquia, o PT e a Zero Hora

A Zero Hora, periódico que já teve seus tempos, tem noticiado os recentes desdobramentos políticos na Turquia. É do conhecimento de leitor que nos últimos dias a população daquele país votou em um referendo que alterou a forma de governo de parlamentarista para presidencialista, ampliando, ainda mais, os poderes do ditador Recep Tayyip Erdogan.

Nas matérias que o jornal veiculou a respeito da situação turca, dos diversos adjetivos que ilustram a figura de Erdogan - entre eles ditador, autocrático, assassino etc. -, o que recebe mais ênfase, decerto sugerindo maior gravidade, é o de conservador, que por vezes vem acompanhado da expressão, onda conservadora - cujo risco à humanidade parece ser o mesmo das tropas da Wehrmacht. (E alguém duvida que a inteligência progressista é pródiga no uso da linguagem?)

Mas será Erdogan um conservador? Creio que não. Conservadores sabem da importância de mecanismos de limitação do poder, dos checks and balances. Sabem que o Estado, no mais das vezes, só atrapalha a vida das pessoas. Na Turquia, Erdogan investe constantemente contra os poderes legislativo e judiciário, mandando prender parlamentares e magistrados que não seguem sua cartilha.

Um conservador sabe do valor de uma imprensa livre, apesar de todos os consectários negativos dessa liberdade. Se a democracia é o menos pior dos regimes, uma imprensa livre é um mal necessário. Ruim com ela, pior sem ela.  Erdogan, além de mandar prender dezenas de jornalistas, mantém sob suas rédeas jornais outrora independentes.

Conservadores em geral sabem das perversidades que um estado autoritário pode infligir na população, daí a valorização do princípio do devido processo legal, de maneira que ninguém perderá sua liberdade ou seus bens sem procedimentos previamente estabelecidos, sobretudo quando animados por juízes independentes. Erdogan pode ser tudo, jamais um conservador. Mas então por que os jornalistas da Zero Hora o chamam de conservador?

Arrisco um palpite. Para a esquerda progressista brasileira a história da humanidade começou com o fim da ditadura militar no Brasil. Junto com a revolução francesa, é tudo o que se aprende em história. Ou vai dizer que você nunca teve que cantar “vem vamos embora, que esperar não é saber” no colégio?

Se o PT pós ditadura dizia-se bonzinho, de esquerda e progressista, dizia também que tudo e todos que não lhe eram alinhados, eram de direita, malvados e, o pior de todos: conservadores. O maniqueísmo estava posto. Ou era de esquerda, ou era ditador. (Além da confusão de conceitos, os jornalistas ignoram o fato da maioria dos ditadores da história recente identificarem-se como de esquerda: os amigos do povo Hugo Chaves e Nicolas Maduro falam por si)

Nenhum jornal sério chama Erdogan de conservador, e aqui incluo os abertamente progressistas New York Times e Guardian.O grande crime do PT não tem a ver com a lava jato, com o mensalão ou com qualquer outro que se descubra. O PT encampou para si todas as virtudes possíveis do homem, de modo que se você não vestisse vermelho, necessariamente teria de vestir o verde escuro dos militares. Se o prejuízo financeiro está sendo recuperado pelo Ministério Público, o prejuízo moral vai demorar algumas gerações para ser quitado.

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